10 de mar. de 2011

Uma Carta ao Rei

Caro Roberto Carlos,

Escrevo essas mal traçadas linhas como forma de afeição, pois sou admirador da sua música desde criança. E esta carta existe apenas por um simples e único motivo: Roberto, o senhor precisa se modernizar. Há anos seus arranjos são os mesmos, pastiches da genialidade que já se exibiu um dia. São poucos os que te dão o merecido valor. Quem é rei nunca perde a majestade, mas muitas vezes é possível chegar ao ridículo - como o imperador nu da história de Andersen. E o caminho pode ser muito mais fácil que você imagina: um bom começo é ouvir este As 15 Super Quentes que o seu antigo parceiro Lafayette gravou com uma meninada carioca que é uma brasa, mora?

Seu amigo de fé, irmão camarada, Erasmo, soube envelhecer muito bem sem deixar a qualidade cair. O último disco dele, Rock'n Roll, foi um dos melhores do ano passado - em grande parte graças a parcerias com um pessoal mais novo (Nando Reis, João Barone, Chico Amaral). Lafayette também deixou os cabelos brancos aparecerem sem nenhum problema. É fácil perceber como ele se sente um garoto com esses tremendões (que não são aqueles do Erasmo, antes que exista qualquer confusão). É só ouvir "Je T'Aime (Moi Non Plus)" e logo dá pra entender o que eu digo.

E esses tremendos guris também não fazem feio, viu, Roberto? Aposto que o senhor não conseguiria ficar parado com o suingue de Gabriel Thomaz na guitarra, se emocionaria com Renato cantando “Só Vou Gostar de Quem Gosta de Mim” e com certeza pararia o casamento se a Érika Martins pedisse. Isso sem falar nos arranjos novos que eles fizeram pra grandes músicas do seu repertório. "Força Estranha" e “Nossa Canção” fizeram com que eu tivesse arrepios e ficasse com lágrimas nos olhos, "O Sósia" trouxe à lembrança as trapalhadas do filme "Em Ritmo de Aventura", e simplesmente saí berrando pela casa com "Você Não Serve Pra Mim".

Como bom fã, assisto a todos os seus especiais de fim de ano na Globo. E me dá uma tristeza cada vez maior te ver chamando grupos que muito pouco ou nada tem a ver com esse passado tão glorioso. E nos seus momentos solo, que deveriam salvar a noite, as repetitivas instrumentações me dão enfado.

Chego a ficar com pena de mim mesmo por dizer isso, mas por muitas vezes estive a ponto de desligar a TV. Anos atrás, vislumbrei uma tênue luz no fim do túnel: foi quando você se juntou ao Jota Quest - um conjunto pífio - pra cantar "Além do Horizonte". Infelizmente, depois nada semelhante ou parecido aconteceu. Mas eu confio que bem no fundo do seu coração, aquele roqueiro dos anos 60 ainda existe. Ou mesmo o soulman do começo dos anos 70.

Muitas emoções já vivi ouvindo o senhor. Mas quero muitas mais - e não apenas essa sensação de pesar e de decepção que acontece anualmente em todo Natal e uma triste nostalgia toda vez que escuto um velho disco seu na minha vitrola. São os detalhes que fazem a diferença. Não peço nem mais por mim, mas por você, Roberto, pela sua memória, por tudo que você já fez: ouça com carinho este disco.


(publicado originalmente em abril de 2010, no Pop to The People)

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